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O papel da memória na construção do futuro que se deseja em Pygmalion, de ONEUS

Atualizado: 11 de mai.

por Thainá M.

(Foto: RBW)


Os momentos do passado, as lutas do presente e as expectativas do futuro se entrelaçaram para formar a poesia cantada em Pygmalion, o 9º mini-álbum do ONEUS, lançado no último dia 08 de maio de 2023. Em seu primeiro comeback com cinco membros, o grupo passa pelas memórias formadas em sua jornada de quatro anos até aqui — entre célebres e difíceis etapas, ambas celebradas, ainda que de forma agridoce —, mas as deixa onde devem ficar: para trás.


Usando o mito de Pigmalião e sua releitura na Psicologia para elaborar o conceito do álbum, os membros deixam explícito para onde estão voltando seus olhares. À frente de nós, inúmeras possibilidades de futuro se formam e entre elas está a que almejamos construir e é nela que o ONEUS traça sua jornada.


Para começar a compreender o conceito usado no álbum, retomamos a mitologia grega clássica, onde Pigmalião era um escultor talentoso que se apaixonou por uma de suas estátuas mais belas. Galateia — como ele a chamou — se tornou sua companhia na ilha de Chipre, onde ele antes vivia isoladamente. Pigmalião implorou à deusa Afrodite que desse vida à Galateia e tornasse o fruto de seu desejo idealizado em uma mulher real, pedido esse que foi concedido pela deusa e que permitiu aos dois se casarem e terem filhos.


Na Psicologia, o mito de Pigmalião dá nome ao Efeito Pigmalião, que descreve como nossas expectativas — ou nossos desejos e idealizações — têm efeito prático em nossas vidas e na forma como nos relacionamos com o nosso futuro. Nossas expectativas sobre alguém ou sobre nós mesmos, se manejadas de forma positiva, podem surtir grande efeito em nossos desempenhos, no alcance de nossos objetivos e na busca por nossos ideais.


Em Pygmalion, o ONEUS começa a traçar um objetivo de futuro e nos apresenta um álbum extremamente coeso, com todos os elementos musicais e coreográficos já conhecidos pelos fãs do grupo, mas adiciona um aumento de seu espectro musical e se firma ainda mais como um representante da 4ª geração do K-Pop que se conecta perfeitamente com os saudosos da 2ª geração.


(Vídeo: ONEUS YouTube)


TRACK BY TRACK

Intro: LETHE


Lethe é uma belíssima introdução ao álbum. O som do violoncelo que abre a canção é logo acompanhado por um violino — nos apresentando à base de influência clássica que, de tão forte no conceito, respinga na musicalidade — que dão lugar à uma batida firme que conduz a música para o seu ápice. A voz de Leedo e Seoho se apresentam tão profundas quanto as águas do rio Lethe, um dos rios mais famosos do submundo do Hades, que na mitologia grega era o rio do esquecimento, que condenava todos que dele bebessem ou tocassem ao oblívio completo. Nos poemas de Eneida, Virgílio narra que é pelo Lethe que passam as almas que podem reencarnar. Para que possam habitar um novo corpo, é preciso que esqueçam de tudo que já viveram. Na letra de Intro: LETHE vemos como a memória de alguém sufoca o eu-lírico, que deseja a libertação do passado: “End the breath of my memory. Your traces strangle me.” ¹ As águas do Lethe são, portanto, invocadas.


ERASE ME


Erase Me é uma faixa-título que é a cara do ONEUS. As batidas de EDM são acompanhadas por instrumentos clássicos novamente, o que dá à música certa personalidade que a incorpora ao álbum perfeitamente. Lembrar a música de debut, Valkyrie, não é uma coincidência, na minha opinião. A memória é elemento constante nesse trabalho, logo, um ode ao começo é necessário. Nessa letra vemos a necessidade de apagar as lembranças de um relacionamento passado para que se acabe com a dor do presente, de não estar mais junto, para só assim poder seguir em frente. Apagar momentos vividos, porém, implica em apagar um pouco de si mesmo, de sua própria história, e é esse sentimento que nomeia a canção.


UNFORGETTABLE


Pré-lançamento do álbum, Unforgettable ganhou um MV no dia 27 de abril de 2023. No cenário desenvolvido os membros encaram o fim iminente do planeta e, por consequência, o fim de suas vidas. Apesar da circunstância, eles escolhem passar por esse momento unidos e desfrutando como podem. Em uma cena em que eles escolhem assistir filmes juntos, clássicos do cinema são referenciados, como Viagem à Lua (1902). Na coreografia, outros passos de coreografias antigas do ONEUS são relembrados². Na letra, vemos como o processo de superação é contínuo e que sentir tanta falta do que é inesquecível se mostra como um desafio à memória.


ECHO


Echo contou com a participação de Leedo na sua criação e somente esse fato seria suficiente para que ela figurasse entre uma das músicas mais esperadas pelos fãs, mas ela entrega ainda mais. Os vocais dos membros estão extremamente pegajosos ao interpretar essa letra, que abre espaço para interpretações bem sensuais. O tempo passa pelo eu-lírico da canção entre o presente e a expectativa do que pode ser vivido no futuro breve. É uma música onde o ONEUS expande seu espectro musical e nos apresenta um som mais melódico que se afasta da ballad tradicional.


HALLEY’S COMET


Minha primeira impressão sobre essa música foi a de que ela é extremamente visual e pensei imediatamente que ela deveria estar no soundtrack de algum drama. O tom alto dos vocais — mais uma novidade que eles trazem neste trabalho — permite uma dramatização que nos transporta para outra realidade muito facilmente. Nessa letra, um momento breve na memória é constantemente rememorado, mas o eu-lírico parece perceber que não bastará a lembrança e não podendo voltar ao passado, correrá para que aquele momento bom retorne — lembramos aqui que para os gregos clássicos o tempo era cíclico, como a órbita de um cometa, amarrando mais uma referência —, como um cometa que espalha seu brilho novamente para nós, depois de percorrer seu próprio caminho. Percebemos que os bons momentos podem voltar e podem ser presente e futuro.


A MEMÓRIA E O FUTURO PARA O ONEUS


(Foto: RBW)


A memória preenche Pygmalion do início ao fim e se firma como elemento chave na construção do futuro. Em uma análise mais aprofundada, visualizamos nesse trabalho do ONEUS um ode à memória, mas não como uma celebração ou uma exaltação do passado, mas como uma ferramenta para a ideação do futuro que se almeja.


Na História, em outros campos do conhecimento, ou em nossas vidas pessoais, o que compõe a memória é o que nos impulsiona ao futuro, com a adição de tudo que aprendemos ao perder e ganhar, nos momentos de felicidade ou de frustração. É a memória, em sua vivacidade no presente, que forja nossos objetivos ao lapidar nossos desejos e marca em nós aquilo que devemos lembrar para aprender, direcionando ao esquecimento aquilo que já não nos serve e que abrirá espaço para novos aprendizados. É por isso que, para Platão, filósofo grego do século IV a. C., como ele bem descreve em A República, aprender é relembrar.


Pygmalion ilumina um caminho de boas expectativas para o ONEUS, uma nova fase onde novamente a memória cumprirá seu papel e entre lembrar e esquecer, To Moons podem construir com eles um futuro de novas realizações de sonhos e cheio de novidades para serem apresentadas. Honestamente, eu mal posso esperar para ver de muito perto, como sempre, tudo que Seoho, Leedo, Hwanwoong, Keonhee e Xion ainda têm para construir.



NOTAS:


¹Tradução do coreano para o inglês, com adaptações, por @NordicWingz no Twitter.

²Identificação e recorte feito por @Belllaaaho no Twitter.


REFERÊNCIAS:


BRANDÃO, Junito de Souza. Mitologia Grega. Vol. I. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 1986.

CARVALHO, Renato. Efeito Pigmalião. Disponível em <https://rescola.com.br/efeito-pigmaliao/>. Acesso em 20 de maio de 2023.

MARÃO, Públio Virgílio. Eneida. Belo Horizonte, MG: Autêntica, 2022.

PLATÃO. Livro VII. In: PLATÃO. A República. Belém: EDUFPA, 2000.

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