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A natureza do lirismo poético de Han Jisung, em Winter Falls

Atualizado: 11 de mai.

por Marcela Pêpe

(Foto: Stray Kids Youtube)


Se você é fã do Stray Kids ou acompanha o trabalho deles, provavelmente já sabe que o Han tem grande influência na voz sensível do grupo. Enquanto membro do 3RACHA, linha principal de produção e força motriz indispensável do Stray Kids, todas as músicas que são escritas por ele trazem consigo um lirismo poético extremamente ímpar e que conversa conosco; as palavras de Han Jisung parecem se deslocar de dentro dele para dentro de nós num caminho expresso. A sensação é de que o que nos rodeia não existe, nada que não permeia nossas mentes ou habita nossos corações parece ter lugar na imagem artística que as músicas de Jisung constroem. O que ele nos confessa com tanta bravura são os sentimentos reclusos que todos nós temos e não sabemos muito bem como externar. São aqueles pensamentos que só dividimos com as nossas pessoas de confiança e, às vezes, nem com elas. Han é um artista corajoso, passional e intimista.


Recentemente, em uma entrevista para o programa japonês WOWOW, Han afirmou querer ser um artista que vive na mesma era que as pessoas, alguém que é capaz de capturar as histórias de várias delas através de sua música, criar um senso de empatia coletiva, ser como a figura de um amigo que é um orgulho para quem o escuta e é exatamente esse desejo que permeia o seu trabalho desde sempre.


Como Han é um artista poético, vou analisar uma de suas músicas, Winter Falls, tendo em vista sua poeticidade. Para isso, eu acho importante diferenciar o que é poética e o que é poético. A poética é uma palavra utilizada para englobar os estudos teóricos e críticos acerca de uma determinada manifestação artística, ou seja, é o estudo do estilo de cada artista. Por exemplo, se eu pretendesse, nesse texto, analisar todas as músicas escritas por Jisung e não apenas uma, eu estaria fazendo um estudo da poética de Jisung.


Já o poético é tudo aquilo que nos inspira e que produz em nós um dado estado de espírito. O poético pode estar ligado tanto a manifestações artísticas quanto a manifestações da natureza como, por exemplo, uma rosa, um pôr-do-sol ou o mar. Quando digo que Jisung é um artista poético é porque sua arte e suas palavras são capazes de transmitir e de provocar os mais diversos sentimentos e emoções. O nosso tempo entende que a poesia engloba desde uma forma particular de conhecimento até uma dimensão de existência, dessa forma, tudo que nos cerca pode ser poético e tudo que sentimos, por mais ínfimo que seja, pode ser poético. Tudo que é preciso é a mente, a alma, o coração e as mãos de um poeta. E Han Jisung, como um artista de seu tempo, entende isso perfeitamente bem.


(Foto: Stray Kids Youtube)


Dando início a análise, Winter Falls é a terceira música do álbum Christmas EveL do Stray Kids, lançado em novembro de 2021.


A primeira estrofe de Winter Falls inicia com os versos “A brisa fria do inverno está soprando novamente/ O tempo passou novamente?”. Partindo desses versos, é possível notar que Jisung expressou o tempo decorrido através da passagem das estações do ano. Ao dizer que o inverno sopra novamente, subentendemos que o que ele expressa na música já vem acontecendo há pelo menos um ano, desde o inverno anterior. Continuando com “Todo mundo mudou, mas eu não/ Eu me sinto muito sozinho e isso dói muito/ Eu ainda sinto muito a sua falta/ Eu ainda continuo parado naquele lugar”, Jisung reforça que o inverno marca o decorrer do seu tempo. O frio típico da estação também pode ser utilizado na construção de um sentido nesses versos: Han parece congelado e, portanto, imóvel diante do mundo, apegado às memórias da pessoa que ele já não tem mais. Além disso, ele se sente sozinho sem o contraste do calor daquela relação que ele tanto sente falta para tirá-lo daquele momento gélido.


Na segunda estrofe, é dito que “Os dias estão ficando mais curtos e as noites mais longas/ No meu coração frio e dolorido, algo gelado derreteu/ Depois de repetir entre congelar e derreter/ Meu coração perdeu sua quentura por meros arrependimentos”. Quando menciona as mudanças na duração dos dias e noites, Jisung se utiliza, mais uma vez, da natureza para transmitir seus sentimentos. O solstício de inverno na Coreia do Sul se inicia no primeiro dia com a noite mais longa e vai até o dia 5 de janeiro, com dias mais curtos.

Esse primeiro dia com a noite mais longa acontece por volta de 22 de dezembro e, por coincidência ou não, Winter Falls faz parte do álbum que foi lançado como um especial de natal, que acontece durante o solstício de inverno. Quando se refere ao seu coração frio, que derrete e recongela em um ciclo, Han Jisung parece falar de uma relação que apresentava certa instabilidade e não fica claro se existia culpa de alguma das partes. O que parece é que Jisung se culpa por deixar com que os receios e arrependimentos de sua parte congelassem de volta o seu coração que já estava amolecido em nome daquele afeto. O trecho “Nós somos como um filme, eu me sinto sem fôlego/ Falar sobre os velhos tempos me faz revirar na cama novamente/ Embora eu saiba que não há nada que eu possa fazer/ Sou lembrado outra vez quando hesito depois de ver pedaços seus” reforça a sensação de que esse arrependimento o assombra e o prende de certa maneira naquela situação.


O refrão se inicia com “O inverno cai, a neve cai/ Mais pura do que qualquer coisa/ Cai, eu vou tentar apagar tudo sobre você que ainda existe em mim/ Eu te amei, amei, amei/ Como você amou, amou, amou/ Mais uma vez, a neve cai/ Nós nos separamos” é possível observar um jogo de palavras quando a letra é vista em inglês. Jisung brinca com os múltiplos significados da palavra “fall” ao dizer que o inverno chegou com a neve que cai (verbo fall) e que eles se amaram antes da neve cair novamente e eles se separarem (verbo fall apart). Isso pode ser observado com mais clareza no verso que vem um pouco adiante “Please fall before I fall”, que pode ser traduzido no sentido de “Por favor, caia antes de eu cair” como no sentido de “Por favor, se apaixone antes de eu me apaixonar”, e enlaça perfeitamente os dois sentidos que ele utilizou nos versos anteriores.


A música continua com “Estou bem agora/ Eu vou ficar bem/ Já chega/ Eu não me importo, vá embora” e aqui fica claro que além dos arrependimentos e do sentimento de imobilidade diante de seus sentimentos, o eu lírico ainda está em processo de negação. Após detalhar como é difícil se desvincular da pessoa e de sua memória, Jisung é hipócrita ao afirmar que está bem e que não se importa com a ausência de quem amou. Isso se confirma nos versos seguintes “Eu procuro por você nas minhas memórias (te encontrar)/ Nós estávamos segurando as mãos enquanto andávamos naquela época/ Foi um inverno quente/ Tudo era bonito naquela época”, onde ele também demonstra que boa parte do frio que ele atribui ao inverno do momento em que a música está se passando é resultado de seu estado emocional.


“Escondido sob o céu silencioso, eu tento esvaziar minha mente/ Porque é mais fácil te afastar do que te esquecer/ Seja do tempo que sinto falta ou seja de você que sinto falta/ Eu não sei porque, mas ainda tenho sentimentos persistentes por você/ Mesmo se eu fingir ser forte, eu só pareço engraçado/ Quantos anos eu vou precisar para ficar bem?/ Só vai doer, não importa o quanto eu cave em minha memória/ Eu vou ser o deixado com cicatrizes e se sentindo pequeno”


A música, então, se revela mais e mais como um relato de alguém que perdeu um amor e que está passando pelo processo de saber diferenciar a pessoa que o deixou da pessoa de suas memórias, os sentimentos que ele ainda possui da realidade atual e de aprender a lidar com o fato de que uma história de amor que parecia tão bonita tinha atingido um final aparentemente irreversível. Ao dizer, em seguida, “Eu sinto que acordei de um longo sonho” e se questionar “A época em que eu lhe segurava nos braços vai voltar?”, Jisung demonstra que ainda existem esperanças muito vivas dentro de seu coração e que, para ele, a situação ainda é conciliável. Dizendo que sente que acordou de um sonho, ele se mantém sonhando acordado e imagina estar de volta com sua pessoa amada, assim como naquele inverno quente, mesmo sabendo que as chances são muito baixas. Todo esse sentimento se assenta quando a estrofe termina com o verso “Eu tenho que deixar você ir agora, mas é muito difícil”.


Na última estrofe da música, Han Jisung decide que a melhor maneira de se desvencilhar de algo que você precisa deixar ir é queimar tudo, impossibilitando o toque, dificultando o acesso. O verso “Depois de queimar tudo, queimar tudo/ Vamos terminar isso como está, tudo o que resta no final são cinzas” representa o seu desejo de antagonizar com o gelo que o consumia — rígido, palpável, frio e impassível — se utilizando do fogo e do seu poder de transformação. Ao reduzir tudo que ocupava tanto espaço dentro dele a cinzas que poderiam ser sopradas, leves e minúsculas, Jisung encontra uma maneira de retirar a pessoa do seu sistema, como ele demonstra em “Vou queimar o seu coração junto com o vento do inverno/ E deixá-lo ir para longe”.


Por fim, o último verso diz “Agora, ao invés de nós, apenas eu permaneço”. Através desse jogo de palavras, mudando da primeira pessoa do plural para a primeira pessoa do singular, Jisung parece ter entrado em conformidade com a solidão do término. Usando a imagem do MV para complementar essa interpretação, Jisung olha para as chamas ardendo com um sorriso leve que não parecia pertencer ao garoto confuso e machucado do decorrer da música. Winter Falls se conclui com um acordo silencioso entre Han, seus sentimentos e a realidade, que pareciam viver num eterno conflito. Se o inverno anterior havia sido aquecido pelo amor que ele viveu com outro alguém, o inverno de agora seria aquecido pela libertação através do fogo que o limpava por dentro.


(Foto: Stray Kids Youtube)


Winter Falls é uma música muito interessante e todos os sentimentos que Jisung transmitiu através dela me tocaram profundamente. Desde a utilização da natureza como forma de expressar suas emoções até a conclusão através do fogo e da sua simbologia relacionada à renovação, tudo em Winter Falls me fascina profundamente.


Vale lembrar que a minha interpretação não é uma afirmação, é apenas a maneira como eu recebi os sentidos que Jisung colocou na letra dele. Mas essa é a graça da arte dele, não é mesmo? É a capacidade que ela tem de capturar as mais diversas histórias e de significar as mais diversas coisas para cada pessoa, bem como o HAN disse em sua entrevista.


E vocês, o que acharam da música? Alguém tem alguma interpretação diferente?


Espero que tenham gostado da análise e até a próxima! ♥

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