por Ju Defávari
(Foto: Stray Kids Twitter)
O ano era 2017 e a JYP Entertainment surgia com um reality show um pouco diferente dos survivals que já vimos por aí. Com a ideia de fazer um “experimento”, JYP concedeu a chance a um de seus trainees mais antigos, Bang Chan, de montar o próprio grupo e, semana após semana, cumprir missões dadas pela produção e pelo próprio JYP. Os desafios envolviam apresentações de composições e produções autorais e, após cada missão, ser avaliado pelo artista e CEO da empresa na esperança de que nenhum dos membros fosse eliminado e assim pudessem debutar como o grupo originalmente formado. Em março de 2018, Stray Kids debuta com todos os membros e começa sua jornada estelar rumo ao sucesso e a busca pela sua própria identidade.
“The most special star. The odd one, that’s me.”
[A estrela mais especial. A excêntrica, sou eu.]
É com esse e tantos outros versos que Stray Kids nos mostra que a falta de respostas, às vezes, é a resposta. Na última sexta-feira, dia 02, o grupo lançou seu terceiro full album, 5-STAR, em que eles apresentam, mais do que nunca, suas verdadeiras cores, ambições e filosofia diante dos desafios que vêm junto com a fama.
Desde o debut, o grupo aborda em sua narrativa a procura pela sua identidade, começando pelo nome, Stray Kids, que traz esse sentimento da falta de um norte, de um rumo ou identificação. Lá no início, com mini álbuns como I am NOT, I am WHO e I am YOU, já é possível notar um padrão na temática de suas músicas — escritas e produzidas por eles mesmos — como a importância de se encontrar e se sentir pertencente.
A chavinha começa a virar em 2020 com o lançamento do GO LIVE, primeiro full album do Stray Kids, que nos apresentou a faixa-título God’s Menu. Subvertendo qualquer expectativa do público, o grupo criou sua própria assinatura, tornando-se os pioneiros do Mala Taste, uma linha de gênero que combina — como em uma receita — vários outros gêneros, estruturas musicais e conceitos, criando a própria identidade e cor dos oito membros.
Mas foi em NOEASY, mais especificamente na faixa-título, 소리꾼 (Thunderous), que vemos o grupo se apresentar, de fato, pela primeira vez.
“꾼들이 왔어요”
[Os estrondosos chegaram]
É o primeiro sinal do grupo entendendo quais características os tornam quem são e abraçando suas diferenças e nuances. O álbum traz uma faceta muito mais confiante do grupo, em que eles não apenas passam a ter orgulho do que os fazem diferentes como também mostram não se importar com os comentários negativos e maldosos em relação ao seu som ímpar.
Pulando para 2023, com o lançamento do 5-STAR, é notável uma confiança nunca vista antes no grupo. A faixa título 특 (S-Class) é provavelmente a coisa mais Stray Kids que o grupo já lançou. A começar pelo nome, o termo 특, em coreano, significa uma especialidade que alguém possa ter. É nessa nova era que os oito membros nos apresentam a simplicidade de sua especialidade: serem especiais.
O álbum traz 12 faixas bem do jeitinho “barulhento” que eles fazem como ninguém, mescladas entre músicas animadas e melódicas, garantindo uma experiência completa que agrada todos os gostos, sentidos e paladares, bem como Stray Kids tinha prometido lá em God’s Menu.
Desde que o grupo acolheu sua excentricidade, no mini álbum ODDINARY, sua narrativa assumiu um rumo ambíguo e cheio de nuances em que, ao mesmo tempo em que eles se vestem de uma confiança sideral e é possível assumir que possam estar pontuando conquistas em sua jornada, existe também uma certa ideia de “manifestação” naquilo que o SKZ apresenta. Como um sonho e uma visão do que o grupo pode alcançar se continuar trabalhando duro e dando o melhor de si para continuar se superando.
(Foto: Stray Kids Twitter)
TRACK BY TRACK
위인전 (Hall Of Fame)
Toda época de comeback, a JYPE libera um vídeo denominado INTRO em que, já que estão envolvidos em todos os processos criativos, os oito membros do Stray Kids falam sobre as faixas e sobre o processo de criação do álbum em questão. Ao mencionarem Hall Of Fame — uma canção poderosa e, ainda assim, melódica, o perfeito gás para uma primeira faixa —, os membros Bang Chan, Hyunjin e HAN falam como essa música é uma nota sobre como eles querem ser vistos. Assim como os grandes nomes da ciência e história mencionados na faixa, eles querem estar entre os nomes que inspiram através da paixão e dedicação que aplicam em sua arte e criação.
특 (S-Class)
Provavelmente a música mais experimental do grupo desde seu debut, a faixa-título trabalha com muitas imagens em sua letra e arranjo. Como as curvas de um “S” a música percorre trajetos inesperados, o tempo todo subvertendo as expectativas do ouvinte. Essa faixa é o maior selo de maluquice do Stray Kids, no melhor sentido da palavra. É aqui que eles assumem que a melhor qualidade que eles podem mostrar é ser eles mesmos, sempre se reinventando. Ela mostra que, assim como o instrumental que caminha entre diversos gêneros e sentimentos, está tudo bem possuir várias facetas e não se prender a apenas um rótulo. A humanidade e a arte andam lado a lado apresentando pluralidades e essa é a graça da vida. Também na INTRO, Seungmin afirma que o início da jornada do grupo girava em torno de encontrar respostas sobre sua identidade e eles simplesmente decidiram parar de buscar por essas respostas. Stray Kids tem se construído ao longo dos anos, se permitindo vagar e continuar se redescobrindo.
ITEM
E vamos de clubismo! No meu Top 3 entra ITEM, que já mostra sua essência Stray Kids nos primeiros segundos com o arranjo simulando os efeitos sonoros de um videogame, como se acabássemos de desbloquear mais um nível na saga do grupo. Eles brincam com palavras e seus significados, com repetições e rimas, com os altos e baixos na melodia — já marcas registradas dos artistas — e constroem uma crescente na expectativa para então nos recompensar com, na minha opinião, algumas das melhores transições do álbum.
Menção honrosa para Kim Seungmin cantando “Started from the bottom, I made it mine, saw the light, I felt divine” [Comecei de baixo, conquistei o que é meu, vi uma luz, me senti celestial] nos lembrando de todo o trabalho duro que Stray Kids sempre colocou em sua carreira e o quanto eles prezam por manter sua identidade e liberdade criativa para mostrar todas as facetas e pluralidades que o grupo apresenta.
Super Bowl
A primeira faixa em inglês do álbum é simplesmente a candidata a faixa-título em 2020 para o IN LIFE. E como os deuses escrevem certo por linhas tortas, Super Bowl foi descartada no antigo projeto e veio cair perfeitamente no meio do 5-STAR. A faixa segue a mesma temática “gastronômica” que God’s Menu, cheia de referências e metáforas sobre como as músicas do grupo são perfeitas para qualquer paladar, além de abordar com confiança a facilidade com que Stray Kids consegue criar algo tão grandioso e impactante, como se possuíssem a ~~receita para isso. Com uma pegada mais “agressiva” que o restante do álbum, a canção se destaca com um arranjo repetitivo porém viciante, além de membros como Hyunjin e Felix sussurrando quase todo o refrão e, mais tarde, a união de todos os membros cantando juntos. Essa no fone de ouvido é um perigo.
TOPLINE (Feat. JK Tiger)
O primeiro feat em um álbum do Stray Kids, não poderia ser de melhor tom. Mostrando que o maior adversário do grupo são eles mesmo, sempre buscando melhorar e dar o seu melhor, essa é uma daquelas faixas que te fazem acreditar que você pode tudo. De novo eles compartilham, mas dessa vez quase que em tom de deboche, a filosofia de se concentrar no seu trabalho duro e determinação e não ligar para hate (comentários maldosos) pois cada um colhe o planta. Com um rap marcadíssimo, muitas rimas e sempre brincando com inúmeros os significados da palavra “line”, eles entregaram tudo o que prometeram no UNVEIL da faixa.
DLC
A faixa nomeada com o acrônimo de Dance Like Crazy é uma das músicas mais animadas do álbum. Após uma sucessão de músicas poderosas e mais “pesadas”, DLC traz leveza para o ritmo do álbum. Existe um conceito em musicais sobre a expressividade das emoções: quando um sentimento é tão intenso que você não consegue apenas falar, você canta. E quando ele é tão intenso que apenas cantar não é o suficiente, você dança. Às vezes, a única forma de se desvencilhar de algo, é dançando. Changbin, que escreveu essa faixa, afirmou na INTRO do 5-STAR sobre a importância da dança e o senso de liberdade criativa e expressão que ela pode trazer em momentos de bloqueios ou desmotivação.
죽어보자 (GET LIT)
Mais uma pra colocar no último e dançar sozinha no quarto. GET LIT traz os vocais fortes dos membros e um instrumental chiclete, dando o pontapé perfeito para a segunda metade do álbum. Mostrando a confiança que eles possuem em si mesmos como membros mas também como um todo, como grupo, eles mostram seu espírito livre e determinado. Essa é outra dentre tantas faixas do álbum que apresentam essa ambiguidade sobre quem eles são vs. suas ambições e quem eles gostariam de se tornar.
충돌 (Collision)
Avisa que ele é latino! A única música com teor romântico do projeto, composta por HAN, diminui mais um pouquinho o ritmo do álbum para que possamos nos recuperar de todas as “bordoadas” das faixas anteriores. Mostrando um amor intenso porém já findado, a letra é repleta de metáforas e imagens relacionadas ao céu, universo e planetas, mantendo a temática do 5-STAR. O arranjo trazendo ~~latinidades, os trompetes no fundo do instrumental, os vocais suaves em adição a certas texturas ao longo da música, principalmente o toque de um telefone no último refrão, nos ajuda a criar uma narrativa completa e, mesmo assim, nos deixar com um gostinho de quero mais.
FNF
Escrita por Bang Chan e Felix, FNF, que significa Fauna and Flora, é uma canção sobre a perda da natureza que representa a Austrália. Apesar de uma música animada, o instrumental em contraste com alguns vocais, principalmente no refrão, traz certa melancolia para a faixa. Escrita de forma ambígua, FNF traz a possibilidade de uma narrativa onde se perde alguém querido. O verso “I’m catching up” [Estou te alcançando] traz o conforto de que em breve iremos reencontrar essa pessoa — ou a natureza, em questão. Dentre todas as texturas e “sons aleatórios” que Stray Kids gosta de adicionar em suas músicas, FNF apresenta uma de minhas favoritas da carreira: o som dos pássaros que ocasionalmente aparece, ao longo da música, te mantém imerso na mensagem da música, mostrando mais uma vez porque Stray Kids faz música e a faz tão bem.
Youtiful
O combo FNF e Youtiful não é pra qualquer um, não. Bang Chan disse que sempre ouve coisas boas do fandom, STAY, e que sempre quis retribuir o carinho que recebe dos fãs. Foi assim que ele matou todo mundo com Youtiful. Bem do jeitinho Bang Chan de ser, a faixa fica quase com um pézinho na breguice, mas o carinho, a gentileza, a mensagem, é tudo tão querido, tão cuidadoso que não tem como não ficar completamente emo. As referências à temática de estrelas e planetas é presente em toda a letra, também em inglês, nos vocais derretidos e emocionados dos membros. É mais um lembrete do amor purinho que Stray Kids coloca no mundo.
Para finalizar o álbum, contamos também com a versão coreana de THE SOUND e a faixa Mixtape: Time Out que já haviam sido lançadas previamente, trazendo novamente uma pegada mais energética para o fim do projeto.
5-STAR é sobre identidade, se aceitar, perseverança, trabalho duro, troca, carinho e entender que o que te faz especial é sua própria essência. Ele mostra a jornada do Stray Kids até hoje e um vislumbre do futuro, repleto de sucesso e sempre junto dos fãs.
Que sorte a minha, em um universo com mais de um trilhão de galáxias, ter nascido sob as mesmas estrelas que Bang Chan, Lee Know, Changbin, Hyunjin, HAN, Felix, Seungmin e I.N.
REFERÊNCIAS:
Perfeita sua análise, Jude! Pra mim, é o melhor álbum do SKZ e só me deixa mais ansiosa pelo futuro (brilhante) deles!!